Sou patriota, amo minha pátria, para além das suas indescritíveis paisagens geográficas, mas sobretudo, por causa das indissociáveis paisagens humanas de multifaces, razão pela qual a faz mais rica do que pelos minerais caprichosamente guardados em suas águas profundas. Sua grande riqueza é o seu povo e sua grande arte é esta colcha detalhadamente retalhada pelas várias etnias que compõem o que somos hoje e o que seremos amanhã.
Por isso, quando entoam o seu hino, eu me arrepio todo, e com aquele espírito cívico que herdei dos mestres que inculcaram a cidadania, firmo-me altivo ante o pendão auriverde, sem envergonhar-me de adotar uma postura até solene... Quase militar!
Mas o que vimos nesses últimos tempos de exaltação ao sentimento pátrio, foram cenas realmente quixotescas! Vanuza cantou o nosso hino completamente desafinado, numa sessão solene de uma Câmara Municipal de São Paulo, oferecendo aos mais críticos, subsídio de riquíssima simbologia, para tecermos de modo irônico, como já é da índole da brasilidade, a mais refinada crítica social. A cena está lá na internet para quem quiser se deliciar...
Depois dos últimos acontecimentos do senado, a nação deve estar mesmo entorpecida! Os nossos bons chargistas e o Macaco Simão com sua verve sempre irreverente, com certeza farão ou já fizeram, graças à desastrada “performance” da cantora da jovem guarda, as mais hilariantes abordagens...
Talvez seja por causa desse desvario e descontrole rítmico, melódico e cênico, atribuído depois ao uso de remédios fortíssimos, é que Vanuza se superou. Entendam-me os caros leitores, não estou incentivando o uso de psicotrópicos, longe disso... Mas, o evento em si, serviu-me perfeitamente de parábola para referir-me a essa sorte de coisa que vem acontecendo no cenário político, sobretudo, no âmbito do senado federal: um tremendo desafino dos homens de poder com a nação. Cogita-se até mesmo a supressão dessa segunda casa, questionando se para fazer o que fazem, não seria suficiente somente uma. O poder: todos querem ter, poucos sabem usá-lo.
Com as exceções que existem em todo o setor, o mesmo remédio faixa-preta ingerido pela cantora, deveria ser repassado, como numa grande “farra”, aos senhores e senhoras do senado, para que pudessem não só bebê-los, mas “engoli-los” (para usar literalmente a expressão de um dos defensores de Sarney). E quando o efeito assim lhes trouxessem aquela torpeza na voz, aquela frouxidão e conseqüente descoordenação dos movimentos e das idéias, arvorassem também, num só coro, cantar o hino nacional. O resultado desse devaneio seria a expressão mais real do que se passa nas mentes, nas tribunas e nos recônditos daquela casa parlamentar: um desafino geral. Aí sim, assistiríamos a um verdadeiro desrespeito ao senso comum e ao espírito de democracia, diga-se, conquistado a duras penas.
Aproximam-se as urnas mais uma vez e a gente torce para que o povo repudie a ingestão dos mesmos “remedinhos” oferecidos pelos parlamentares, a partir de então, em suas campanhas homeopáticas, para o entorpecimento da memória e da consciência popular, e não perca a grande oportunidade de substituir aqueles que mais desafinam com a defesa dos interesses mais prementes dessa “brava gente”... Unidos poderemos fazer uma orquestração melhor e cantar o hino da pátria com maior galhardia, não somente nessas “manhãs de setembro”, mas nos outros dias dos meses vindouros.