sábado, 17 de outubro de 2009

A força dos pequenos na agricultura familiar

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), incluiu em seu Censo Agropecuário, pela primeira vez, a agricultura familiar brasileira, como demonstra a edição 2006 da pesquisa, divulgada recentemente pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário. Segundo os dados, os estabelecimentos de agricultura familiar representam 84,4% do total, embora ocupem apenas 24,3% da área dos estabelecimentos agropecuários brasileiros (um quarto da área total).

A pesquisa divulgou ainda que a agricultura familiar responde por 38% do valor total da produção, e que mesmo sendo cultivada em uma área menor, é responsável por garantir a segurança alimentar do País e gerar os produtos de cesta básica consumidos pelos brasileiros.

A pobre agricultura familiar, com apenas 24,3% (ou 80,25 milhões de hectares) da área agrícola, é responsável "por 87% da produção nacional de mandioca, 70% da produção de feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 58% do leite, 59% do plantel de suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos e, ainda, 21% do trigo. A cultura com menor participação da agricultura familiar foi a soja (16%). O valor médio da produção anual da agricultura familiar foi de R$ 13,99 mil", segundo o IBGE. Quando se fala em agricultura orgânica, chega a 80%. Além do mais, provou que tem peso econômico, sendo responsável por 10% do PIB Nacional.

Os dados estão aí para comprovar que é o pequeno agricultor, sem muitos recursos públicos, e não os grandes produtores em larga escala dos agronegócios, que mantêm abastecida a mesa da maioria da população brasileira. Enquanto os pequenos agricultores receberam em 2008, 13 bilhões, o chamado agronegócio recebeu um investimento de 100 bilhões! É a lógica de Davi contra o gigante Golias. Portanto, essa pobre, marginal e odiada agricultura tem peso econômico, social e uma sustentabilidade muito maior que os grandes empreendimentos. Retire os 100 bilhões de suporte público do agronegócio e veremos qual é realmente sua sustentabilidade, inclusive econômica. Retire as unidades familiares produtivas dos frangos e suínos e vamos ver o que sobra das grandes empresas que se alicerçam em sua produção.

Mas, a agricultura familiar continua perdendo espaço. A concentração da terra aumentou e diminuiu o espaço dos pequenos. A tendência, como dizem os cientistas, parece apontar para o desaparecimento dessas atividades agrícolas. O que seria um grande pecado, porque saber produzir comida é uma grande arte. Pelo paladar é possível ver se uma comida foi feita com amor ou de qualquer jeito... Essa cultura que implica em outros valores que o agronegócio não sabe cultivar (apesar de todo o subsídio e de todo acompanhamento técnico), vai muito além do valor monetário e do faturamento. Agricultura exige um trato respeitoso com a mãe terra, um sistema cooperativo que reconhece que ninguém tira dela frutos bons, de forma gananciosa e individualista. É preciso, paralelamente ao trabalho árduo, o cultivo do espírito gregário.

Consideremos que o brasileiro tem um enraizamento e uma mixagem com povos de vínculos fortíssimos com a terra: os indígenas, os negros e depois, somaram-se os imigrantes asiáticos e europeus. Preservar esses agricultores é preservar o "saber fazer" de produtos alimentares. Se um dia eles desaparecerem, o povo brasileiro na sua totalidade sofrerá com essa ausência. Para que eles se mantenham no campo são necessárias políticas que os apóiem ostensivamente, inclusive com subsídio, como faz a Europa. Do contrário, se dependermos do agronegócio, vamos comer soja transgênica, milho sem gosto e sem cheiro, chupar cana e beber etanol.

*Mestre em Ciências Sociais